Passado

O trabalho nas Marinhas de sal de Aveiro é uma arte milenar... Para além de ainda se realizar a safra anual, as salinas foram adaptadas a várias atividades turísticas.

Antes da Barra Nova - 1808

O início

Acredita-se que o sal tenha começado a ser usado há cerca de 5 mil anos, tendo-se destacado em países como a Babilónia, o Egipto, a China e em civilizações pré-colombianas.

Já nas sociedades primitivas da Europa, a sua extração ocorreu na idade do bronze no entanto, o seu uso era restringido às populações costeiras. As reservas sujeitavam-se a períodos de escassez, determinados por condições climatéricas adversas e por períodos de elevação do nível do mar, dificultando o seu acesso.

O sal era considerado um produto escasso e precioso, sendo vendido a peso de ouro. Em diversas ocasiões, foi usado como moeda para compras e vendas. De entre os exemplos históricos mais antigos, o mais conhecido nomeia o costume romano de pagar em sal parte da remuneração dos soldados, o que deu origem à palavra salário.

Já no reinado de D. João I (séc. XIV), a quantidade de sal produzida era tanta que o governo facilitava a exportação para o estrangeiro, como medida de grande proveito económico. Entre os países que mais consumiram sal português, evidencia-se a Holanda, a Dinamarca, a Noruega, a França, a Suécia e o Reino Unido.

O sal português foi sempre considerado de melhor qualidade, tanto em Portugal como no estrangeiro, e assim, era um artigo privilegiado, dispensado de qualquer imposto e de portagens. 

Sal de Aveiro

Foi durante a Idade Média que, segundo documentação, se começou a exploração do sal de Aveiro, sal de mar. Então e sempre utilizou-se o processo de evaporação.

O inicio da exploração dos salgados do Vouga coincidiu com a formação da própria laguna, por um lado e, por outro lado, com factores de ordem antrópica que se revelaram fundamentais para a salicultura na região. Vide Formação da Laguna.

Contudo, a este factor de ordem natural há que aduzir outros, de natureza antrópica, patenteados numa conjuntura sócio-política absolutamente estruturante para a salicultura na zona da futura laguna de Aveiro.

Referimos-nos, neste particular:

  1. à pacificação do território em virtude da deslocação para sul do campo de batalha da chamada Reconquista Cristã;
  2. ao crescimento demográfico que se fez sentir, o qual, por certo, foi potenciado pela melhoria das condições climáticas que caracterizaram o período medieval que ficou conhecido como Pequeno Óptimo Climático.

Com a tomada definitiva de Coimbra aos mouros, em 1064, o campo de batalha deslocou-se inexoravelmente para sul. A norte do rio Mondego, o território estava pacificado e tornara-se definitivamente cristão, apresentando a segurança e estabilidade propícias à consolidação de gentes e povoados e à exploração de todos os recursos que a natureza punha à disposição da população.

O comércio do sal “era muito intenso e as portas da muralha da vila do lado do mar ficavam abertas durante a noite, para que não fosse interrompido o serviço da carga e descarga dos navios”.

No início do século XVI o canal da Ria, ainda em formação, tinha profundidade suficiente para permitir o acesso a naus e caravelas e iniciavam-se as primeiras campanhas de pesca do bacalhau à Terra Nova. A vila florescia,  entre os quais muitos estrangeiros, subsistindo economicamente pela indústria do sal.

No entanto, no final do século XVI o mau estado da barra, originado pela sua contínua deslocação para sul e pelo assoreamento das areias, devido ao inverno tempestuoso de 1575, reflectiu-se no comércio e no aparecimento de epidemias, o que provocou o despovoamento da “Vila de Aveiro” e das localidades envolventes.

A cidade encontrava-se num triste cenário, empobrecida, com grande taxa de óbitos e uma reduzida taxa de natalidade. No entanto, em 1759, apesar das péssimas condições, a vila foi elevada a cidade pelo Marquês de Pombal (com o nome de Nova Bragança).

O atrofiamento e assoreamento de alguns canais originaram a redução do grau de salinidade em troços da Ria que deixaram de estar aptos a fazer sal; a monocultura do sal de Aveiro perdeu o interesse a partir da década de 70 do séc. XVII, o que permitiu o desenvolvimento de outras atividades económicas, nomeadamente da pesca e da também tradicional colheita do moliço na Ria.

Há referências a proprietários que destruíam os muros da vedação das marinhas para estas serem utilizadas como “praias” de produção de moliço.

Após algumas tentativas falhadas em 1802, o Eng.º Oudinot foi incumbidos de analisar a situação da barra e de descobrir um modo que garantisse a navegabilidade da Ria, optando pela construção da barra artificial já sugerida pelos holandeses. Para a execução desta solução foram construídos dois molhes, com as pedras da muralha da cidade, demolidas de propósito para o efeito.

a localização de uma possível barra artificial foi alvo de polémica e agitação social porque envolvia interesses contraditórios das atividades desenvolvidas na laguna, nomeadamente a salicultura, a pesca e o cultivo das terras envolventes.

Em 1807 o cenário era caótico, a insalubridade da Ria afetou a salicultura, a agricultura, a pesca, o comércio e a saúde da população, até que em 1808 se efetuou a tão aguardada e desejada, abertura da barra.

Depois da Barra Nova - 1808

O novo início

Após a abertura da barra conservaram-se as marinhas feitas entre 1759 e 1778 e recuperaram-se as marinhas entre o esteiro de Esgueira e o de Sá, para Sul de Aveiro, até Ílhavo.

Verificou-se um novo surto demográfico e económico, que potenciou o atual dinamismo urbano, ambiental, portuário, académico, cultural, comercial e de serviços, num contexto de rápida transformação urbana que alteraram a ocupação e configuração do território.

 

A abertura da Barra permitiu:

  1. a melhoria substancial das condições da laguna, possibilitando o recrudescimento da produção de sal, com a reabilitação de antigas e construção de novas marinhas;
  2. a recuperação da zona como porto, imprescindível para a exportação do sal;
  3. na retoma da pesca do bacalhau;

Com este novo impulso a cidade ganha nova forma e a produção de sal rejuvenesce. 

Ver + salgado de Aveiro.

Entre as décadas de 60 e 70 existiam registos de cerca de 270 salinas ativas em Aveiro. Em 1994, já em número reduzido, apenas 49. Hoje em dia são apenas 9 as marinhas de sal que permanecem em atividade.


(Foto da Barra - 1934)

(Foto descarga de sal - linha de comboio no Canal de São Roque)

(Foto: Aveiro e os montes de sal a perder de vista)